Carol, de Patricia Highsmith

Carol

 Quando abriu a porta do quarto, a visão de Carol trespassou-a como uma lança. Parou um momento, com a mão na maçaneta. Carol olhou-a do banheiro, com o pente suspenso, imóvel, sobre a cabeça. Olhou-a da cabeça aos pés.
– Não faça isso em público – disse-lhe depois. Therese atirou os jornais para cima da cama e foi ao seu encontro.
Patricia Highsmith, Carol, pág. 221

A leitura de Carol, de Patricia Highsmith, veio do fato dele ser o livro que será discutido no Clube de Leitura de Agosto. Este é o segundo livro da autora que leio, o primeiro foi Os Gatos, também por conta do Clube. Já tinha muito interesse em ler esse livro, porque a Cássia Sousa já me indicara ele há um bom tempo, mas com tanta leitura pendente, acabei adiando. Com a leitura concluída, gostaria de compartilhar com vocês alguns aspectos que achei bem interessantes.

O livro é pequeno e de leitura rápida, além de acessível, já que é facilmente encontrado em edições de bolso pela editora L&PM Pocket. A história narra o envolvimento emocional e sexual de duas mulheres, a jovem cenógrafa Therese Belivet e a dona de casa – mas não menos interessante – Carol Aird. As duas se conhecem na loja de departamento Frankenberg`s, onde Therese está trabalhando temporariamente durante o Natal e Carol está indo comprar um presente para sua filha. Encantada com a beleza e carisma de Carol, Therese decide lhe mandar um cartão padrão com felicitações natalinas. Esse pequeno gesto faz com que as duas se reencontrem e iniciem uma amizade.

Com os encontros cada vez mais regulares, as personagens vão apresentando seus dramas e acabam percebendo que, mesmo de forma inexplicável, elas se completam. Sobre Therese pode se dizer que ela é uma cenógrafa que ainda não é considerada uma profissional, pois não conseguiu pagar para se associar ao conselho da categoria, embora, com a ajuda de alguns amigos, ela faça alguns trabalhos pequenos. Já Carol está enfrentando um divórcio e uma briga judicial pela guarda da filha. Antes de terem o apoio uma da outra, Therese mantinha um relacionamento (quase namoro) com Richard; e Carol estava sempre acompanhada de sua melhor amiga, Abby.

Para tentar fugir um pouco da tensão causada pelo processo, Carol convida Therese para uma viagem de carro. E é nessa viagem que boa parte do livro acontece. O leitor é apresentado a várias cidades e estados da América do Norte na década de 1950. A cada hotel, restaurante ou outro estabelecimento em que as personagens se encontrem, o leitor vai percebendo que o tipo de relacionamento que elas vão criando é cada vez mais forte. É durante uma mudança de cidade que o “clímax” acontece. Até gostaria de falar mais sobre ele, mas acredito que o suspense ficaria desinteressante para quem ainda não leu.

Na capa se lê: “O romance que inspirou Lolita, de Nabokov”. Mesmo que ainda não tenha lido Lolita, eu conheço a história, e acredito que as semelhanças estejam principalmente em dois aspectos: o primeiro é o fato de ser uma relação amorosa entre um personagem mais velho e um mais novo (no caso, Therese que “ainda” tem 19 anos e Carol que acabou de passar dos 35); e o outro seria que boa parte da trama se passa na estrada e é recheada de suspense, embora eu ainda não os considere road books propriamente ditos. As duas obras fazem o leitor se questionar se o amor deve ou não seguir um molde, um padrão. Como se criar um modelo para uma relação que é única para cada indivíduo?

highsmithAo ler o pós-escrito, percebi que o início da história foi baseado num episódio da vida da autora. Será que ela vivenciou mais alguma coisa deste romance? Fiquei muito curioso quanto a isso, mas infelizmente não tem como saber a resposta. Outra coisa dita no pós-escrito me deixou muito feliz: o fato da autora conseguir vencer os percalços que lhe impediriam de publicar esse romance. O primeiro seria as várias negativas da sua editora, já que o livro não cabia ao “rótulo” de romance policial criado para a autora (por causa do sucesso de Strangers on a Train, adaptado por Hitchcock); o segundo foi o de ter mantido o pseudônimo – Claire Morgan – por um bom tempo, até poder assumir sua autoria.

Esta é uma leitura que ficará sempre na minha memória e que eu espero poder indicar para todos os meus amigos (e que eles leiam também). Sem dúvida, a Patricia Highsmith entrará na lista de autoras favoritas.

Curiosidades:

  • Embora a ideia de se produzir uma adaptação cinematográfica seja antiga e o projeto já estivesse em andamento, recentemente o diretor John Crowley (Boy A, 2007) passou a claquete para Todd Haynes (Longe do Paraíso, 2002; Não Estou Lá, 2007). O elenco já conta com a presença de Cate Blanchett e Mia Wasikowska (Alice no País das Maravilhas, 2010) e o lançamento está previsto para 2015. Vamos aguardar!

Ficha Técnica

CarolTítulo: Carol
Título original: The Price of Salt
Autor(a): Patricia Highsmith
Editora: L&PM Pocket
Tradução: Roberto Grey
Edição: 2006 (1ª)
Ano da obra / Copyright: 1952
Páginas: 296
Sinopse: Therese Believet vê Carol Aird pela primeira vez em uma loja de departamentos de Nova York, onde trabalha como vendedora. Carol está escolhendo um presente de Natal para a filha e resplandece numa aura de perfeita elegância. A vida suburbana de Carol é tão imbecilizante quanto o emprego de Therese, e ambas partem para uma jornada de erotismo e amor. Se esse caminho será sem volta só lendo o livro para descobrir.

Onde comprar:
Saraiva | Submarino | Cultura

4 comentários

  1. Nossa, amei a sua resenha!!!
    Mais uma vez me deixou com vontade de ler esse livro.
    O tema é muito interessante, e acho que pode até nos ajudar a quebrar certos tabus. Muito bom!

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    • Obrigado, Soraya! 😀
      Acho que atingi o meu objetivo, então! ^^
      O tema é realmente muito interessante. Eu gosto de assuntos polêmicos, aqueles que nos fazem repensar sobre nossos atos.
      Beijos!

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  2. Muito boa a resenha, Mailson. Só faltou mencionar um aspecto desse livro que considero importante (e acho que você não chamou a atenção pra isso por imaginar que é um spoiler, mas como não escrevi a resenha não tô nem aí lol) que é o fato de ser um dos primeiros romances com temática gay, talvez o primeiro, em que os personagens não têm um final trágico. A autora até menciona que recebeu várias cartas de homossexuais louvando-a por isso. Porque ser gay não implica cometer suicídio ou desistir do amor para manter uma relação heterossexual de aparências.

    É por isso que gosto tanto desse livro. Nem tudo é um mar-de-rosas, mas é mais otimista que O segredo de Brockeback Mountain. E as duas histórias se passam quase que na mesma época.

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    • Obrigado, Cássia.
      Isso que você mencionou também achei legal. Acredita que comparei as duas histórias!? Até cheguei a reler o conto (Brokeback Mountain) para tentar fazer um comparativo, mas acabei por não me estender. Achei fofinho a autora receber as cartinhas dos heterossexuais “agradecendo o apoio”. Se não me engano, até alguns heterossexuais também mandaram carta para ela. Alguns momentos do livro me lembraram Longe do Paraíso. ^^
      É sempre bom te ver por aqui! Haha Beijos!

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