Perdão, Leonard Peacock, de Matthew Quick

Perdão, Leonard Peacock

Eu sei que você só quer que tudo acabe, que não consegue ver nada de bom em seu futuro, que o mundo parece escuro e terrível, e talvez você tenha razão, o mundo pode ser, definitivamente, um lugar apavorante. Eu sei que você mal está suportando. Mas, por favor, aguente mais um pouco. Por nós. Por si mesmo.
Matthew Quick, Perdão, Leonard Peacock, pág. 37

Matthew Quick, antes de conseguir todo o sucesso que possui hoje, era um respeitado professor de inglês que tinha como objetivo diário fazer com que seus alunos acreditassem no próprio potencial e no poder da literatura. Mas, ao pensar sobre o assunto, percebeu que ele mesmo não estava fazendo isso. Isso o fez decidir abandonar o emprego e vender a casa para se dedicar ao sonho de escrever. A partir desse passo inicial, ele criou O Lado Bom da Vida, lhe garantindo sucesso e alguns prêmios, não só na literatura, mas também no cinema.

Matthew QuickPerdão, Leonard Peacock, seu quarto e último livro publicado – segundo, no Brasil ‑, traz uma abordagem diferente de O Lado Bom da Vida, já que o protagonista, Leonard Peacock, é um adolescente que acaba de fazer 18 anos. A história acontece em apenas um dia, no aniversário de Leonard, embora existam alguns flashbacks. O garoto, como a própria sinopse já deixa claro, escolheu o dia do seu aniversário para cometer um homicídio-suicídio. E é nesta informação inicial que podemos perceber o quanto o protagonista é complexo.

Narrado em primeira pessoa, o livro nos apresenta os problemas vividos pelo personagem e, em que momento de sua vida ele chegou a tomar a tal decisão de “sumir definitivamente”. Mas, como acontece com a maioria dos suicidas, Leonard decide se despedir das pessoas que fizeram alguma diferença em sua vida. Aproveitando que é seu aniversário – e que ninguém lembrou a data, nem mesmo sua mãe ‑, ele decide entregar um presente para cada uma dessas pessoas. São elas: Walt, um senhor de idade avançada que mora na casa ao lado, seu companheiro de filmes antigos do Humphrey Bogart; Baback, um colega iraniano, violinista, que também sofre bullying na escola; Lauren Rose, uma jovem religiosa, que dedica boa parte do seu tempo a entregar panfletos da sua igreja nas estações de metrô; e, por fim, Herr Silverman, seu professor do Holocausto, e única pessoa que lhe “olha nos olhos e sorri sinceramente”.

Forgive me, Leonard Peacock
Capas pelo mundo.

Simbolicamente, ele acaba deixando um presente para sua mãe, Linda, que se mudou de cidade para cuidar de sua carreira de estilista, deixando o filho sozinho. Ainda no campo da simbologia, ele pretende entregar um presente a Asher Beal, seu ex melhor amigo. Mas para Asher, o presente disponível é a morte, segundo palavras do próprio Leonard. E são esses dois últimos personagens citados que são os maiores “responsáveis”, se pudermos chamar assim, pela atual circunstância do protagonista. Como a citação a seguir mostra:

Essas pessoas que chamamos de mamãe e papai nos trazem para o mundo e, em seguida, não nos acompanham em nossas necessidades ou não nos dão qualquer resposta. No fim das contas, é cada um por si, e eu simplesmente não fui feito para levar esse tipo de vida. pag. 149

Em relação aos outros personagens, eu diria que todos são bem construídos, embora eu tenha simpatizado mais com uns que com outros. O problema envolvendo Leonard e Asher, embora fique evidente logo nas primeiras páginas, eu prefiro não evidenciá-lo aqui, pois para algumas pessoas pode soar como spoiller, mas só aviso que não é uma situação difícil de superar. Não só pelo fato em si, mas pelas justificativas e situações secundárias envolvidas.

Herr Silverman é de longe meu personagem favorito, não só pela importância dele para o desenvolvimento da trama, mas como “pessoa”. Acho que todos nós precisamos de professores mais humanos, que olhem nos olhos dos alunos, e que consigam perceber que eles têm uma vida fora da escola. E que, se não houver uma atenção, por mínima que seja, em relação a esse fato, muita coisa pode se perder no caminho. Não só em relação ao processo de aprendizagem de conteúdos escolares, mas em ensinamentos de vida. Pode até parecer uma fala piegas, mas um olhar humano pode mudar muita coisa.

Humphrey Bogart - by George Hurrell
Humphrey Bogart – by George Hurrell

Outro personagem que me encantou bastante foi Walt, o vizinho idoso de Leonard. Acredito que ele me agradou mais por sua paixão por filmes e pela sua forma de ver o mundo. Pelo que pude perceber em Walt, ele sempre acreditou que planos são importantes sim, mas que viver o momento é tão importante quanto. Embora seja um pensamento simples, mas Leonard só percebe isso depois de muitos filmes e conversas com Walt. Eu gosto tanto da forma como eles se tratam, da forma descompromissada e sem cobranças de um para com o outro. Como no dia em que se conheceram, na citação seguinte:

(…) Você já viu o bom e velho Humphrey Bogart em ação?” “Não”, respondi. Ele arregalou os olhos e disse: “Meu Deus, você não tem ideia do que está perdendo! Sente essa bunda ignorante na minha sala e vamos começar com O Tesouro de Sierra Madre.” E foi assim que Linda me empurrou para o vizinho do lado quando eu precisava de uma figura paterna. pag. 24

O livro é muito rico, intenso e emocionante. Pretendo ler outros títulos do autor, e espero ansiosamente que a Editora Intrínseca traga-os em breve. É uma leitura rápida, embora angustiante em certos momentos. A linguagem simples, visto que é um livro para jovens leitores, ajuda bastante. Não posso falar mais, além de “Boa Leitura!”.

Outros títulos do autor:

  • O Lado Bom da Vida (The Silver Linings Playbook, 2008)
  • Sorta Like a Rock Star (2010)
  • Boy21 – (2012)
  • Perdão, Leonard Peacock (Forgive me, Leonard Peacock, 2013)
  • The Good Luck of Right Now (2014, segundo página do autor)
  • Love May Fail (2015, segundo página do autor)

Postagens relacionadas:

– Resenha: O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook, 2012)

Ficha Técnica

Perdão, Leonard PeacockTítulo: Perdão, Leonard Peacock
Título original: Forgive Me, Leonard Peacock
Autor(a): Matthew Quick
Editora: Intrínseca
Tradução: Alexandre Raposo
Edição: 2013 (1ª)
Ano da obra / Copyright: 2013
Páginas: 224
Sinopse: Hoje é o aniversário de Leonard Peacock. Também é o dia em que ele saiu de casa com uma arma na mochila. Porque é hoje que ele vai matar o ex-melhor amigo e depois se suicidar com a P-38 que foi do avô, a pistola do Reich. Mas antes ele quer encontrar e se despedir das quatro pessoas mais importantes de sua vida: Walt, o vizinho obcecado por filmes de Humphrey Bogart; Baback, que estuda na mesma escola que ele e é um virtuose do violino; Lauren, a garota cristã de quem ele gosta, e Herr Silverman, o professor que está agora ensinando à turma sobre o Holocausto. Encontro após encontro, conversando com cada uma dessas pessoas, o jovem ao poucos revela seus segredos, mas o relógio não para: até o fim do dia Leonard estará morto.  

Onde comprar:
Cultura | SubmarinoSaraiva

8 comentários

    • Perfeito é a palavra certa…
      Confesso que comecei a leitura com um pouquinho de preconceito. Mas o livro realmente me ganhou!
      E, adorei sua resenha sobre esse livro.
      Beijos

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    • Como ainda não vi/li O Lado Bom da Vida, não posso afirmar.
      Mas posso dizer que esse é incrível, independente da fama do outro.
      😀

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  1. Fiquei com vontade de ler esse livro, na verdade, os livros do autor, que já são muito bem recomendados por aqui. Achei a temática do livro bem interessante, e coisa boa pode sair da[i, como sua resenha afirma. O mais legal é saber que o autor transcreve para a ficção, suas próprias experiências de vida, o que dá um tom realístico e cru. Vou procurar ler o quanto antes 😀

    Abraços, Joshua
    – pensamentosdojoshua.blogspot.com

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    • É isso ai, Joshua… Os livros são bem recomendados no Brasil, e eu estou recomendando ainda mais.
      A temática é um dos pontos fortes, mas a forma como ele aborda, torna-a ainda mais interessante.
      Ele é extremamente realista, deveria lê-lo sim.
      Abraços!

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  2. Acabo de ler o livro e adorei. Dei 5 estrelas. Quick consegue se sair melhor que em O Lado Bom da Vida, que achei até um pouco monótono, mas com bela escrita. A habilidade do autor em apresentar um adolescente cheio de conflitos é de conquistar o leitor. O personagem encanta, comove, tudo na medida. E o ponto alto – o momento dramático a que se propõe – é bem tenso.
    Como vc, tb adorei Herr Silverman!
    Bela resenha!

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    • A bela escrita é um dos pontos positivos do autor.
      O universo adolescente é cheio de perspectivas, e eu adorei a forma como ele abordou uma delas.
      Acredito que concordamos em pontos comuns. ^^
      Obrigado pelo elogio!

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